
O menino vem caminhando em direção à praça da cidade. A única rua calçada nesse lugarejo é aquela que está ao redor da praça, que por essa descrição, imagina-se um círculo. As outras ruelas são todas de chão batido.
Atrás do menino vem o pangaré. Velho.
Bem velho.
Puxado por uma corda cuja ponta está na mão do menino. Os dois caminham desanimados.
Parecem dois velhos.
Mas não devia ser assim.
O único desanimado deveria ser o velho, não acha?
É, mas tem muito menino hoje em dia, tão velho quanto o velho. Tão desanimado quanto o pangaré. Será que o futuro de hoje não é mais tão sedutor como o futuro de antigamente?
O pangaré não tem futuro, mas o menino tem.
Tem?
Os dois estão descalços. O pangaré tem os cascos, mas já estão gastos. O menino só tem os pés, mas não liga pra isso não. O problema não está nos pés. Está no futuro.
Será um futuro sem pangarés? Ou um futuro sem futuro.
Será um futuro sem meninos?
E o pangaré? Quem é?
Ah, esse já trabalhou muito. Nasceu e viveu a vida quase toda na maior fazenda da cidade que é do homem mais poderoso, o Coronel Pitangueiras. Trabalhou muito o tempo todo. Montado no pangaré, que na época era um potro, e antes dele no pai e no avô do pangaré.
Trabalhou muito e fabricou prosperidade.
Agora está velho.
Não! O pangaré não. O Pitangueiras.
O pangaré também está velho. Foi doado pra uma família de lavradores da região.
Mas o Pitangueiras está desanimado. Tudo dói. Não tem mais a força de sempre e nem a visão do agora. Está esquecido e desanimado.
Parece que vai puxado por uma corda, em uma estrada em direção à praça, por um menino mais desanimado que ele.
Ninguém mais lhe vê. Não é mais importante. Os cascos lhe doem. Os ossos mais ainda.
Agora é só uma voz…
… e uma sombra.